sábado, 10 de dezembro de 2011

MANIFESTO PELO SAMBA PAULISTA


Ouvimos diariamente os representantes do poder público discursar a favor de uma política de inclusão social, inclusão digital e até mesmo inclusão étno-racial. Mas o que mais nos impressiona é a falta de respeitabilidade que ano após anos resvala nos principais mantenedores e cuidadores da cultura do Samba bem como o processo de invisibilidade ao qual esse mesmo poder público submete o mais popular da musica popular brasileira, o Samba.


Presenciamos há alguns anos uma tentativa de descaracterização das legítimas manifestações artístico-culturais existentes em nossa cidade por meio de um processo de exclusão cultural dos atores que fazem a manutenção e a propagação periódica da história, origens e importância política do Samba que nasce com objetivos de sociabilidade étnica, resistência cultural, manutenção dos aspectos peculiares de identidade étinico-racial e como um espaço de organização de construção de conhecimentos transmitidos através da oralidade dos velhos mestres do Samba respeitando as tradições de matriz africana.


Em São Paulo, os atores e promotores e cuidadores da cultura popular periférica da maior cidade da América Latina mais uma vez ficaram de fora, pelo terceiro ano consecutivo, da programação da “Virada Cultural”, evento que reúne cera de 30.000 (trinta mil) pessoas que transitam por 20 (vinte) palcos espalhados no centro da cidade, evento esse que custa Milhões para os cofres públicos pagos com os impostos diuturnamente pagamos do nosso bolso.
No Rio de Janeiro a situação não é diferente.


A visibilidade que se dá ao samba e aos sambistas, fica única e exclusivamente a cargo dos agentes promotores desta cultura ou mesmo por parte dos próprios atores que desenvolvem o gênero como meio de sobrevivência e resistência étnico-cultural. Não há qualquer ação política do Estado para fomentar e fortalecer as ações culturais desenvolvidas pelos sambistas que atuam no subúrbio da cidade preservando e valorizando as raízes da história e da memória do Samba; ao contrário, o poder público da mais visibilidade aos artistas midiáticos e inviabiliza e “invisibiliza” os demais atores que cultuam preservando culturalmente o mesmo gênero musical!
É inadmissível que o sambista ainda sofra esse tipo de exclusão e invisibilidade frente às diversas políticas públicas que contemplam outros seguimentos culturais.
Sabemos que a maior parte desses seguimentos estão ligados direta, e ou, indiretamente às raízes do Samba tendo como elemento central o batuque versando com experiências ligadas ao teatro, cinema, produção de documentários, etc. que viabiliza estes segmentos e deixando o Samba apenas como um pano de fundo ocasionando dessa forma uma sensação de que o
Samba não passa de um pequeno ator cujo papel cumpre uma parte insignificante em todos os atos.

O Samba em São Paulo tem uma história que se confunde com apropria história da cidade bem como do nosso prospero e geograficamente privilegiado Estado. Em 1914, nasce uma das principais manifestações “Sambísticas” e carnavalesca de São Paulo, o Grupo Barra Funda que foi fundado pelos irmãos Dionísio Barbosa e Luiz Barbosa.
Em uma viagem antropológica pelo interior do Brasil na década de 1930, Mario de Andrade desenvolve uma pesquisa sobre as manifestações culturais no interior de São Paulo e, ao se encontrar com um grupo de foliões que batucavam um ritmo envolvente e peculiar, identifica e denomina-os como “Samba de Bumbo” sendo este a “célula mãe” do Samba Paulista.

Já nos idos da década de 1956, Carlos Alberto Caetano (Carlão do Peruche) funda a Escola de Samba Unidos do Peruche, mas antes participou de uma das principais Escolas de Samba de São Paulo, a Lava Pés, fundada em 1937 por Madrinha Eunice e Chico Pinga sendo a Escola de Samba mais antiga em atividade no Carnaval Paulista.

A tradição que o Samba em especial o Samba de São Paulo guarda nos anais de sua história, desperta um sentimento de igualdade comparado à tradição conhecida em outras regiões do Brasil e a cada dia, a cada semana, a cada ano essa tradição se instala com muito mais fulgor nos corações dos mais variados sambistas nas diversas regiões da cidade tornando-os mantedores da nossa cultura.
Grandes quilombos urbanos se formam a cada dia nas longínquas regiões periféricas em defesa de nossa cultura e na valorização do nosso velho e bom samba. Embora não seja um desses quilombos periféricos, temos uma enorme satisfação em coordenar diversos e importantes movimentos de samba de São Paulo, situados desde o centro velho de nossa cidade às mais longínquo regiões periféricas de nosso Estado.

Há alguns anos existe uma grande movimentação de sambistas também preocupados com a preservação do samba e da memória dos baluartes. Queridos veteranos que, com muita resistência e perseverança, iniciaram na década de 20 (vinte) uma luta contra preconceitos étnicos e sociais em defesa do Samba. Posso destacar alguns movimentos que protagonizam ações onde o samba é o principal elemento de resistência cultural. São eles: Projeto Nosso Samba, Samba da Laje, Pagode do Cafofo, Samba da Tenda, Samba da Vela, Comunidade Maria Cursi, Samba do Baú, Samba de Todos os Tempos, Cupinzeiro, Samba da Toca, Pagode do Sobrado, Samba da Ponte, Samba da Feira, Comunidade Samba Jorge, Canto pra Velha Guarda, Samba da Alegria, Samba do Livro, Abrigo de Vagabundo, Samba da Paz, Projeto Cultural Samba Autêntico (Rua do Samba Paulista), dentre outros e de Sambistas que objetivam as mesmas lutas coletivizando sem participar de um comunidade de samba.
“Vemos uma nova possibilidade de preservação cultural e registro histórico da nossa manifestação cultural mais popular e aglutinadora.

A história do samba de São Paulo é linda e com belas páginas que já foram escritas por grandes bambas do nosso samba como Dionísio Barbosa, Geraldo Filme, Paulistinha, Pé Rachado, Germano Matias, Zeca da Casa Verde, Dona Olímpia, Dona Sinhá, Madrinha Eunice, Dona Lola, Seu Dito Caipira, Toniquinho Batuqueiro, Seu Carlão do Peruche, Talismã, Ideval, Zelão, Juarez da Cruz, Henricão, Pato N’Água, Seu Nenê, Xangô da Vila Maria, Tia Lourdes, Tia Zefinha, Benedito Lobo, Plínio Marcos, Mestre Feijoada, Osvaldinho da Cuíca, todas as Velhas Guardas e tantos outros que, sem sombra de dúvidas, se destacam no cenário cultural como verdadeiros “Heróis do Samba”!

Não somos adeptos às políticas “intra-partidárias” nem tão pouco temos em nossos discursos e ações qualquer tipo de fala “viciada” oriundas de partidos políticos e nem ostentamos estandartes, símbolos e nem brasões partidários seja das alas esquerdistas, direitistas ou “centro-acomodados”, porém, é preciso explicitar neste documento que a expertise ideológica dos cuidadores do Samba em São Paulo defende uma bandeira política não partidária que dialoga com a real democracia social e cultural prevista na constituição brasileira.


Vivemos um momento histórico de pleno crescimento econômico e social em nosso país, mas os desafios que os nossos governos ainda estão por enfrentar são muitos.
Entendemos que o processo de democratização que viabilizará de forma inclusiva e igualitária a diversidade cultural existentes em nosso país somente será possível a partir da vontade política dos gestores públicos que dentem as in-competências de fomenta a cultura em toda sua diversidade ocasionando, de certa forma, um verdadeiro reconhecimento das entidades e atores cuidadores e mantedores da cultura popular brasileira, em especial, do Samba em nosso Estado.


Somos frutos de gerações de militantes e amantes do Samba que, sem sombras de dúvidas, foram responsáveis diretos por hoje cultuarmos, preservarmos, e difundirmos o samba em âmbito Nacional bem como foram os principais entusiastas que, no traumático e complexo período do regime militar, organizaram a sociedade civil menos favorecida em torno da cultura do Samba criando e protagonizando conceitos político-sociais fundamentais para que o
caráter organizacional deste gênero peculiar e principal referência da música brasileira de com fama internacional pudesse ser considerado como um dos principais elementos de organização social, resistência cultural e articulação política.

Diferentemente do centralismo democrático, regulador e excludente imposto pela elite que comanda há anos o Estado de são Paulo, acreditamos que a inclusão sócio-cultural de quem, de fato, faz a cultura do povo é fundamental para que haja a verdadeira democracia em nosso Estado propiciando assim, um ambiente mais igualitário, includente e livre do processo de “Estadania” ao qual vivemos periodicamente com o estado brasileiro ditando todas as regras sociais, políticas e culturais de nossa sociedade.


Se a cultura vem do povo, entendemos que é o povo quem deve promovê-la e discutir propostas de estruturação das diversas manifestações musico - culturais existentes em nosso País bem como dar todos os indicadores para os gestores públicos de como pensar e administrar o Estado, pois fazendo uma pequena e humilde referência a Karl Marx, “O Estado deve se organizar a partir das necessidades estruturais e culturais do povo e não o povo se moldar ao sistema do - centralismo democrático - imposto pelo Estado”.
Fazendo aqui uma pequena alusão ao grande pensador W. Adorno da escola de Frankfurt, que misturavam crítica econômica e crítica cultural da sociedade capitalista, é imprescindível explicitar que somos “fazedores” e curadores da cultura que consumimos sem filisteísmo ou conivências com este modelo alienador e predatório criado pela indústria cultural que insiste em promover des-cultura de péssima qualidade pra grande massa e fomentar cultura de qualidade apenas para a burguesia.

Este manifesto tem o objetivo de fomentar uma discussão aprofundada sobre os valores e os impactos sociais promovidos pela cultura do Samba em nosso Estado bem como alertar para os processos de invisibilidades aos quais os sambistas de São Paulo estão protagonizando neste infeliz episódio da vida real.

T. Kaçula

Sambista e Sociólogo



...Eu sou paulista
Gosto de samba
Na Barra Funda também tem gente bamba
Somos paulistas e sambamos pra cachorro
Pra ser sambista não precisa ser do morro


Geraldo Filme






Assinam este manifesto:

UESP – União das Escolas de Samba Paulistana
Associação das Velhas Guardas de São Paulo
Projeto Rua do Samba Paulista – Centro - SP
Raiz do Monte - Jd. Monte Azul - Zona Sul.
Candeeiro do Samba – Diadema.
Samba do Sino – Guarulhos.
Samba de Primeira - Pirituba - Zona Oeste.
Samba do Porto - Jd. Porto Velho - Zona Sul.
Samba da Quinta - Chácara Santana - Zona Sul.
Ministério do Samba – Osasco.
Samba do Mês - Jd. Ipanema – Zona Leste.
Pagode do Cafofo - Jd. Marília - Zona Leste.
Samba do Monte - Jd. Monte Azul - Zona Sul.
Nosso Samba de Osasco – Osasco.
Samba no Asfalto - Ermelino Matarazzo - Zona Leste.
Comunidade Samba Jorge - Vila Curuçá - Zona Leste.
Pagode da 27 - Grajaú – Zona Sul.
Samba da Olaria – Vila Alpina – Zona Leste.
Comunidade Maria Cursi – São Mateus.
Samba da Tenda – Jd. São Vicente – Zona Leste.
Pagode do Sobrado – Guarulhos.
Buraco do Sapo – Freguesia do Ó – Zona Norte.
Samba da Laje – Vila Santa Catarina – Zona Sul.
Sociedade Samba dá Cultura – Piraporinha – Zona Sul.
Samba da Berinjela – Limão – Zona Norte.
Samba de Todos os Tempos – Santo Amaro – Zona Sul.
Comunidade do Pé da Raiz – Santo André.
Abrigo de Vagabundo – Guaianazes – Zona Leste.
Samba da Toca – Itaquaquecetuba.
Samba da Alegria – Brás – Centro.
Canto da Velha Guarda – Guarulhos.
Samba da Vera Cruz -
Samba da Ponte – Capão Redondo – Zona Sul.
Família Casa Blanca – Vila das Belezas – Zona Sul.
Samba do Livro – Pirituba – Zona Oeste.
Projeto Cultural Samba Autentico – Freguesia do Ó – Zona Norte.
Terreiro de Samba de Mauá – Mauá.
Pegada de Gorila – Itaim Paulista – Zona Leste.
Samba da Velha – Santos.
Samba da Vila Ré – Vila Ré – Zona Leste.
Samba da Feira – Casa Verde Alta – Zona Norte.
Comunidade da Vila Fundão – Vila Fundão – Zona Sul.
Samba do Quintal – Pedreira – Zona Sul.
Tem Família no Samba – Diadema.
Ouro Verde – Santos.
Comunidade Vó Tiana – Campinas.
Afromix – Campinas.
14 Sambas Quilombolas – Piracicaba.
Samba de Terreiro de Araraquara – Araraquara.
Samba da Arca – Guarulhos.
Comunidade Sambista ABC – São Bernardo do Campo.
Quilombo – Vila Brasilína – Zona Sul.
Terreiro de Compositores – Pq. São Lucas – Zona Leste.
Berço do Samba de São Mateus – Zona Leste.
Clube do Samba de Piracicaba – Piracicaba.
Educasamba – Taboão da Serra.
Comunidade Samba e Poesia – Piracicaba.
Comunidade Maria Zélia – Brás – Centro.
Samba do Buli – Bom Retiro – Centro.
Projeto Terra Brasileira – Brás – Centro.
Comunidade Panela do Samba – Sorocaba



T. Kaçula, Alisson Rodrigues, Daniel Santos, Emerson Urso, Marquinhos jaca, Dentinho D´Oxossi, Brão Lopes, Anderson Alves, Selito SD, Ilcéi Míriam, Helio Rubi, Juca Ferreira, Claudio Silva, Babalu, Ari (Samba da Ponte), Carina e Karina (Samba da Paz).